Carta ao Supervisor

Certa feita, me deparei com o seguinte relato.

“Meu querido doutor de cabeças, pai terapêutico dos adultos não crescidos, amante clinico das mulheres insatisfeitas, atencioso ouvinte dos que negam o óbvio, e dos que almejam o impossível, amigo estimulante dos impotentes na vida e dos dom-quixotes sem moinho. Um dia pagarei meu débito” ¹

Refleti, então, como por uma “livre associação” sobre um trecho conhecido de Jung.

“Conheça todas as teorias, domine todas as técnicas, mas ao tocar uma alma humana, seja apenas outra alma humana”.

Todo este contexto remeteu-me a pensar em nossa atividade, que ao mesmo tempo profissional humana. E, com muitas histórias de créditos e débitos não comercializáveis. Acredito que o relato traz um débito que não pode ser quitado, até talvez, para ser preservado, e imortalizado em sua vida.

Penso que muitas vezes ouvimos estórias reais e imaginárias, memórias (distorcidas?), sonhos, vividos ou não, desejos (im)pensáveis, esforços (ir)realizáveis, batalhas aflitivas, sofrimentos contorcidos. E, ficamos ali, com a pessoa, ainda que ela ou a gente mesmo, de alguma forma não queira este encontro.

Em nossa prática mesclam-se ciência e espiritualidade, técnica e sensibilidade, limites e criatividade. Lembrei-me, então, de Da Vinci, uma artista multidimensional, repleto de inquietações criativas, e que conseguia juntar o que todos separavam.

E assim, quis de algum modo, agradecer-lhe toda a ajuda e inspiração nesta arte de se lidar com pílulas e palavras.


1. Ricardo Maxiliano. Analista, Ma Non Troppo: A Clínica Analítica Pensada a Partir da Prática . Editora Unesp, SP, 1997